quinta-feira, 7 de julho de 2011

Por relações mais democráticas nos espaços públicos

No dia 06 de julho de 2011, foi realizada na Assembléia Legislativa do Espírito Santo, uma sessão especial para discutir a temática "Violência escolar e o fenômeno bullying", com a especialista Cleo Fante. A proponente desta sessão foi a deputada Solange Lube.

Estive lá e realmente a palestra da professora Cléo Fante foi esclarecedora. A pesquisadora contribuiu rompendo com o discurso do senso comum que aponta que qualquer situação de conflito se configura como bullying, o termo da moda. O tema foi apresentado com simplicidade e clareza. Acredito que os estudantes presentes conseguiram acompanhar e esclarecer suas dúvidas em relação à temática.

No entanto, não pude deixar de me frustar, pois, na minha avaliação, houve vários equívocos na condução dos trabalhos. Em primeiro lugar, em relação ao desrespeito ao público presente (alunos, professores, coordenadores, diretores, etc) que foram convidados para uma sessão às 14h que se iniciou próximo das 15h.

Em segundo, num momento que se propõe a ser democrático, o tempo de escuta e de fala deveriam ser equilibrados. Um assunto importante como o que foi tratado na referida sessão não poderia ser "debatido" com questões objetivas, sem contextualização, sem problematização. Na verdade, não houve debate e sim uma "escolha" das perguntas as quais seriam respondidas pela professora Cléo Fante.

Por que minha indignação? Pois bem, vamos aos fatos. Nos foi entregue a cópia da lei que institui o dia de conscientização contra o bullying (Lei Nº 9.653/2011, D.O. de 29/04/2011). A deputada Luzia Toledo nos solicitou idéias sobre o que fazer para "comemorar" este dia ano que vem. A conscientização contra o bullying deve ser diária e insistente. Sei que a data é simbólica, mas receio que mais uma data simbólica seja criada, como já acontece com a consciência negra, o dia internacional das águas e por aí vai. Não precisamos de ações pontuais. Isso nós já fazemos. A representante da Secretaria Estadual de Educação do Estado do Espirito Santo (SEDU) disse que os professores recebem capacitação e isso não é verdade. Se há ação na escola sobre este tema, se há formação é porque as escolas, de forma pontual, realizam. Não há uma intencionalidade institucional.

A professora Cleo Fante falava da participação da comunidade escolar na construção de regras coletivas (foi isso que entendi), mas a SEDU impõe um Regimento Comum a todas as escolas da Rede Estadual, desconsiderando as especificidades.

Não seria ali, naquela sessão, na presença daqueles sujeitos, um espaço oportuno para dialogar sobre todas essas questões?

Outra questão: A Deputada Solange Lube disse que, juntamente com o Deputado Da Vitória, por comporem a Comissão de Educação, tem tido a oportunidade de conhecer melhor as escolas e as superintendências do Estado. Nossos jovens ficam 5 horas na escola, sentados em cadeiras desconfortáveis, em ambientes depredados, o que os desmotivam, inclusive a acreditar que é possível mudar. A proposta de uma cultura de paz pressupõe uma cultura de direitos humanos que deve garantir educação de qualidade que passa por espaço físico adequado para que os jovens fiquem por mais tempo na escola, assim como valorização profissional, o que inclui formação em serviço.

Poderiamos ter debatido ali, como implantar uma cultura de paz nas nossas escolas. A professora Cleo Fante deu os passos, os caminhos, mas trilhá-los sem comprometimento político não é possível, pois a escola sozinha não dá conta. Aém disso, os tempos/espaços da escola são rígidos e dificultam algumas ações.

Como professora de Sociologia da EEEFM Aristóbulo Barbosa Leão, localizada no município de Serra, tenho tido experiências muito positivas com os alunos, no entanto, sei que há muito o que fazer. Sei que a cultura de paz não é construída de um dia para o outro. Não é milagre. É um fazer diário. Criei um blog para dialogar com os jovens alunos sobre esse e outros temas (sociologiaabl.blogspot.com).

Sou também pesquisadora na área de violência escolar. Defendi minha dissertação de mestrado ano passado e acredito que foi na pesquisa de campo, com jovens, que aprendi a ser professora. Gostaria muito de dialogar sobre essas e outras questões, com aqueles que compartilham comigo  o interesse pela educação, pelos direitos humanos, por uma cultura de paz e por uma valorização dos nossos jovens.

Fica aqui o desabafo, já que ontem não pude me manifestar na referida sessão. Me neguei a fazer uma pergunta objetiva, superficial, sobre uma questão que merece DEBATE. Debate é ação sem a qual uma sociedade democrática não pode abrir mão. Diálogo pressupõe fala e escuta.... e aí, vamos dialogar?


12 comentários:

  1. Parece-me que o bullying é mesmo um termo da moda para a "velha" violência simbólica já colocada por Bourdieu.
    Violência esta que tem como pressuposto as relações desiguais de poder. E quem pode mais na nossa sociedade?
    A escola então continua a ser um lugar em que a cultura/classe dominante "tem poder" sobre a maioria (que dizem que é a minoria). E ainda nós, professores, somos sim pedidos para fazer milagre. Milagre de fazer "esses meninos" acreditarem que podem mudar algo que não depende apenas deles.
    Aí não debatem, não nos deixam falar, aiaiai....
    Bom desabafar, neh?!

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  2. As vezes fico apavorada com as pessoas que conduzem os grupos de trabalho sobre a educação em nossa assembléia.
    Tb achei que o estado era laico + o evento começou com um salmo seguido de muita rasgação de seda e algumas asneiras parlamentares, acho que em alguns momentos até Deus teve que tampar o ouvido.

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  3. Bom, professora concordo com você que o bullyng é um tema que deve ser "debatido", mas acho que nossas autoridades não estão capacitadas e muito menos enteressadas em nossas opniões, mas nem por isso devemos desistir de lutar. Se cada um fizer sua parte ja ajuda. adorei o site e a oportuniade dada a cada um de nós através dele é maravilhosa. BJS
    Marina de Paula ABL

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  4. É isso aí, Marina, não podemos desistir. Precisamos persistir. Essa luta é nossa!

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  5. Letícia, é isso mesmo. Faço a análise da violência simbólica em minha dissertação. Fiz essa opção teórica por creditar que o "bullying" é um termo da moda (importado).

    Não aguento mais essas pessoas achando que somos "milagreiros". Não reconhecem o nosso trabalho como profissão e sim como sacerdócio.

    Obrigada pela possibilidade do diálogo...

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  6. Também fiquei surpresa quando o presidente da Assembléia abriu a sessão em nome de Deus e pediu à Deputada Luzia Toledo para ler um versículo da Bíblia (um Salmo). Sou cristã e o que me causou estranheza foi justamente o fato de que num Estado laico, esse tipo de ação não deveria existir. Concordo com você, Keila. Abraços.

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  7. Não estive presente nesta sessão especial, mas imagino que deve ter sido sim muito proveitosa. Concordo que alguns temas são tratados como modismos como é o caso do bulliyig e atualmente também o tema do homossexualismo com suas cartilhas e tudo mais...Acredito que são temas sempre atuais por que fazem parte do nosso cotidiano e devemos buscar sempe o debate com os alunos para que eles construam suas percepções sobre a realidade em que vivem e não simplemente as aceitem sem criticas.
    Gosteria de colocar minha experiência como professora de Sociologia, realizada em 2010 em uma escola de ensino médio da Serra. Confesso que foi muito frustrante e nada fácil preparar e fazer acontecer as aulas. Não havia material didático, muito pouco apoio da escola e da própria SEDU. E o mais dificil de tudo é lidar com a falta de interesse dos alunos. E foi ali no ambiente escolar que observei todas as mazelas da nossa sociedade, violência, desrespeito, preconceitos, drogas... Temas presentes no cotidiano escolar e que devem ser trazidos para debate, momento em que a sociologia tem um papel muito importante.
    Agradeço à Prof. Fabíola pela oportunidade e admiro muito o seu trabalho.

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  8. Edi, a escola não é uma ilha. Faz parte da sociedade, logo, os problemas existentes na sociedade se fazem presentes sim na escola. É mesmo frustrante como você disse perceber que não há espaço para o diálogo mesmo na escola.

    A Sociologia, como disciplina, ainda não foi "bem entendida". Penso que deveríamos organizar um forum para discutir o que e como ensinar Sociologia no Ensino Médio. Este ano fizemos a escolha do livro didático a ser adotado ano que vem, mas esse processo não foi fruto de um debate.

    Já fiz uma proposta de seminário sobre o ensino de sociologia no ensino médio a uma professora da UFES (departamento de CSO) e também a um representante da SEDU, mas não obtive resposta. Poderíamos pensar num grupo independente para organizar esse seminário. O que acham disso? Alguém se candidata?

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  9. NÃO SOMOS MESTRES EM NADA, SOMOS APRENDIZES...
    E COM ERROS E ACERTOS É QUE VAMOS...CAMINHANDO...NINGUÉM SABE TUDO....

    ENTÃO ACHEI A PROPOSTA ASSERTIVA PORÉM COMO TUDO NA VIDA NECESSITANDO DE IMPLEMENTAÇÕES, QUE PODEM COMEÇANDO COM O CONHECIMENTO PRÉVIO DAS PROPOSTAS LANÇADAS EM TAL EVENTO...

    O PIOR DE TUDO PARA MIM FOI PORQUE NÃO TER CHAMADO ALGUMA AUTORIDADE OU PROFESSOR CAPIXABA PARA DEBATER O TEMA COM A NOSSA REALIDADE? SEM DEBATER O MÉRITO DA REFERIDA QUASE DOUTORA CLÉO (AINDA ESTÁ ESTUDANDO)...

    EXISTEM SIM NA SERRA TRABALHOS RELEVANTES DE MUITOS ANÔNIMOS QUE COMO HERÓIS DESAFIAM A TODO MOMENTO A INSTRUMENTALIZAÇÃO DA ESPERANÇA EM NOSSOS ALUNOS.

    ACREDITO QUE DEVEMOS PARAR DE CRITICAR E UNIR FORÇAS....TRABALHAR EM REDE......PARAR DE CRITICAR SEM CONHECIMENTO PRÉVIO O QUE É UM TRABALHO PONTUAL E UM TRABALHO COM PROFUNDIDADE QUANDO SE TRATA DE CONSTRUÇÃO COLETIVA DE REGRAS, PARTICIPAÇÃO DOS EDUCADORES NA CONSTRUÇÃO DE AÇÕES INTEGRADAS AO CURRÍCULO ESCOLAR.

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  10. Perfeito, fico feliz por ter uma professora com mente tão centrada!

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  11. ei professora muito interessante as suas colocações
    parabens

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  12. muito boa as suas colocações
    parabens

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