Fabíola dos Santos Cerqueira
Mestre em Educação (PPGE/UFES)
Em
maio de 2010 defendi a dissertação de Mestrado intitulada “Juventude, violência simbólica e corpo: desvelando relações de poder
no cotidiano escolar”. Na ocasião pretendia compreender as formas de
violência simbólica entre jovens do Ensino Médio do Município de Vitória e seus
comportamentos diante da pressão por um corpo perfeito e a influência desse
padrão na sociabilidade juvenil e estudantil. Pude identificar que a pressão
por estar “na forma” é evidente entre meninos e meninas, que desejavam ser
sarados e magras, respectivamente. Queriam ser notados pelos seus corpos que
insistiam em exibir enquanto os adultos insistiam em mantê-los encobertos, pelo
menos no interior das escolas. Desconheciam os riscos das dietas milagrosas sem
prescrição médica e chegaram a afirmar que entre ser “gorda” e “anoréxica”, o
melhor seria a segunda opção. Caracterizavam a gordura corporal como desleixo,
como falta de cuidado e de vontade própria, pois "quem queria, não era
preguiçoso, tinha um corpo legal”.
Estou
trazendo este recorte de minha dissertação objetivando denunciar e alertar a
todos sobre os males e os riscos da anorexia nervosa, doença que só fui
conhecer de verdade quando a mesma bateu à minha porta e atingiu a minha filha
de apenas 13 anos. No início tratava-se apenas de uma restrição alimentar
simples objetivando manter o corpo (que já era magro) em forma (pura vaidade).
Com o passar dos dias fui percebendo que a quantidade de alimentação estava
cada vez menor. Em dezembro do ano passado, após um desmaio, procurei por
vários médicos (cardiologista, pediatra, neurologista, endocrinologista) e
todos eles me disseram, com base nos exames que estava tudo bem. Mas ninguém me
dava atenção quando eu dizia que ela comia muito pouco.
Em
maio deste ano a nutricionista do CENTROCOR me alertou de que a minha filha
estava desnutrida. Imediatamente entramos em contato com a pediatra que
recomendou atividade física, comida e psicóloga. Duas semanas depois minha
filha foi internada num hospital particular do município de Serra com um quadro
de desnutrição, com IMC (Indice de Massa Corpórea) igual a 13. A internação
ocorreu depois de muita insistência, pois apesar da menina mal conseguir andar,
todos afirmavam que ela estava ótima, afinal seus exames laboratoriais assim o
diziam. Nos nove dias de internação ficou claro que os profissionais do
hospital não sabiam o que faziam. Insistiam apenas que ela tinha que se
alimentar para melhorar e que se tratava de um problema de fundo psicológico.
Não foi feita uma avaliação psicológica porque esta estava de férias e o
psicólogo do hospital, apesar de ser acionado, não fez a avaliação. Tivemos que
pagar profissionais externos para fazer a avaliação psicológica e psiquiátrica.
Esse
relato, onde exponho minha intimidade e a de minha família servem para alertar
aos pais quanto à alimentação dos filhos. Restrição alimentar ou dieta, como
queiram chamar, somente com orientação profissional. Não podemos nos deixar
levar pelos comerciais, pelas receitas caseiras ou pela “neura” de chegar a um
“peso ideal” a qualquer custo. O custo pode ser alto. Pode ser a própria vida.
Chamo
atenção às autoridades da área da saúde (pública e privada), pois os hospitais
e os médicos de maneira geral (exceto os especialistas da área) não sabem
identificar a doença e quando a mesma é identificada não sabem como agir. Se
existe a piada de que médico quando não sabe o que temos diz que é virose, se
ele souber que você tem anorexia nervosa, seus sintomas tornam-se
“psicológicos” e nada é feito, pois quem cuida desses sintomas é o psiquiatra.
Quando a anorexia nervosa será reconhecida como uma doença social dessa
sociedade de consumo e do culto ao corpo magro? Quando os médicos aprenderão a
olhar para os pacientes e seus familiares com menos preconceito? Quando
entenderão que não comer deixou de ser uma escolha e passou a ser uma doença?
Como
profissional da educação, insisto que a escola (que não é uma ilha, mas está
inserida na sociedade), deve também estar atenta a estas questões, a fim de
evitar casos de bullying e de qualquer forma de exclusão (que pode se dar
através de um olhar, de uma palavra sem intenção de ferir, por exemplo).
A mídia impõe a tríade: ser bela, ser jovem,
ser saudável. Hoje as mulheres querem ser magras, leves e turbinadas para se
sentirem belas. Enquanto
cidadã penso na loucura que é tentar encaixar-se num padrão de beleza que
sequer existe. Quando nos deixarão ser felizes do jeito que somos? Quando teremos
coragem de dar um fim à ditadura da magreza? Afinal, sabemos quanto custa não
estar na forma? Já fez as contas, leitor?
Publicado no Jornal A Tribuna, de 05 de setembro de 2012, na coluna Tribuna Livre, com algumas adaptações para se adequar ao espaço da coluna.
Nenhum comentário:
Postar um comentário